20/02/2010

BEIJO À LENA EM RECADO A UM DEUS IMPOTENTE


Eu não sei quem é o Deus em que, durante anos, me quiseram fazer acreditar.
Cresci a ouvir falar de um Deus que cuida de nós nas horas difíceis, infinitamente bom, omnipresente, que tudo vê e é misericordioso na sua infinita sabedoria.
Um Deus assim ter que ser justo e forte, como um guerreiro em quem se confia para travar ao nosso lado as mais duras batalhas.
Que Deus misericordioso é este de que vocês me falam e que permite que um Pai veja partir uma filha, um ser humano bom, depois de uma batalha longa e terrível, tantas vezes à beira de ser ganha e sempre cruelmente perdida no passo seguinte, até ao derradeiro momento ?
Que Deus infinitamente bom é este que permite que em 22 anos de vida alguém possa passar duas vezes pela terrível experiência de perder a Mãe ?
A vida ensinou-me uma vez mais que o Deus da minha meninice não existe.
Não posso partilhar da vossa devoção a este Deus.
Não a ataco, (quem sou eu para isso ?), mas não consigo, simplesmente, compreender.
Este Deus que vocês - amigos, pessoas de quem gosto, gente que admiro - diáriamente veneram é aos meus olhos injusto, falível, tantas vezes cruel, fraco. Um deus impotente, apenas.
Dizem-me que a Fé não se discute. Concordo. Todos temos direito a acreditar nos nossos deuses.
Por isso permitam que vos diga que, espantosamente talvez, até eu tive Fé e acreditei, ao longo dos meses em que tão impotente como o vosso Deus vi a Lena ir de batalha em batalha com uma força, um sorriso e uma coragem que pareciam inesgotáveis.
Têm nome de gente os alvos da minha Fé, esses meus deuses são Ricardos, Salomés, Isabéis, Anas, Ilídios, Sónias, Saras, Cristinas, Carlas, Alexandres, Henriques e tantos outros que, vestidos de verde, azul, branco, percorrem os corredores de uma casa demasiado grande numa cidade demasiado pequena tentando salvar vidas.
Ás vezes não conseguem. E choram, impotentes, o que os torna aos meus olhos ainda mais deuses.
Não têm igrejas nem altares mas terão para sempre a minha gratidão expressa num simples aperto de mão, num abraço.
Perdoem-me, mas eles sim são os deuses em quem tenho fé, mesmo quando falham.
Porque são humanos e bons e misericordiosos.
E agora tenho que ficar por aqui, porque tenho a janela aberta para disfarçar o cheiro da cigarrilha e já antecipo o raspanete da Lena...
Ela sim, omnipresente.

9 comentários:


  1. não posso deixar de sentir tuas palavras toda o peso que a tua/vossa perda, repetida com toda a violência que as perdas têm. Como já te disse no Face, estou contigo na tristeza do teu sentir e entendo toda a tua descrença. Tens razão para isso. Mas... quem somos nós?!! Força e conta com os amigos mesmo os que ,como eu, estão tão afastados pela vida mas continuam a se-lo
    Um forte e sentido abraço para ti e para o Diogo

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  2. NAS HORAS DE GRANDE SOFRIMENTO, REVOLTAMO-NOS E ZANGAMO-NOS COM DEUS, MAS É, QUANDO MAIS NOS LEMBRAMOS D'ELE. E SE FALAMOS D'ELE E NOS LEMBRAMOS D'ELE E NOS ZANGAMOS COM ELE, É PORQUE ACREDITAMOS N'ELE, QUE ELE ESTÁ ALGURES, EMBORA NEM SEMPRE NOS DÊ O QUE NÓS PEDIMOS E QUEREMOS. TAMBÉM NÃO DAMOS AOS NOSSOS FILHOS TUDO O QUE NOS PEDEM, EMBORA FOSSE ESSE O NOSSO DESEJO.... ESCREVE, ZÉ, FAZ BEM À ALMA, E ASSIM OS TEUS AMIGOS AINDA ESTÃO MAIS JUNTO DE TI.

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  3. E TENS UM GRANDE CORAÇÃO.... TRÊS HOMENS SOFRENDO A PERDA DA LENA E TU SOFRENDO PELOS OUTROS DOIS... É LINDO. BEM HAJAS...

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  4. Companheiro...

    O que interessa é ter Fé! Seja lá no que fôr...

    Para vocês...Um beijo!

    http://www.youtube.com/watch?v=YzkZPI-HKsk&feature=related

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  5. deus ha-de estar presente como sempre. desta vez para te ajudar neste momento dificil. saudades da lena.

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  6. Zé, sinto-me na realidade muito em falta contigo, por não ter estado presente... fisicamente, falo. Mas podes acreditar que, nem por um momento, consegui até hoje esquecer-te e sofrer, em silêncio, pelos momentos de dor que estás a passar e, pelo teu filho, que muito embora não conheça pessoalmente, é um jovem com uma cruel história de perdas...
    Sou de tal forma cobarde, que nem sequer arranjei ainda coragem para te telefonar... Não sei o que te dizer, não consigo formular qualquer discurso coerente para te dizer de olhos nos olhos... e por isso te peço perdão! Como te entendo e ao teu desabafo... Um abraço grande e conta incondicionalmente com o meu apoio no que precisares... Mili

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  7. Zé....

    Gostava de conseguir exprimir o que me vai no coração da mesma forma que tu o fazes, mas vou tentar que compreendas o que me vai na alma...
    Ter conhecido a Lena e ter-te conhecido mudou a minha vida e durante estes meses pensei vezes a fio na batalha que travavam sempre com um sorriso nos lábios, e rezei. Rezei muito para que esta batalha fosse ganha e a Lena cumprisse o prometido de "pagar uma grade de minis e tremoços na praia de Faro"... mal sabia ela que eu nem aprecio cerveja... apreciava sim a companhia dela e a tua, a força dela e a tua... PESSOAS FANTÁSTICAS...
    Não consegui ler e reler esta tua "nota solta" sem sentir um aperto no peito, uma lágrima encravada desejando-se soltar a cada instante, a cada palavra...
    Lamento não ter conseguido fazer mais por voces... mas não lamento não ter dito Adeus à Lena porque ela continuará presente em mim como um exemplo de força, fé, alegria, esperança e amor...
    Obrigada por tudo o que me transmitiram e quero que saibas que poderás contar comigo para o que precisares...
    Um abraço apertado,
    Isabel Outeiro

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  8. Sempre me ensinaram a Acreditar, mas quando me deparo com perdas de gente Boa e Inocente sinto RAIVA e tal como tu, pergunto onde é que Ele estava e porquê?

    Se perder uma Mãe dói e dói muito, perder duas é uma dor que nunca mais acaba só superada por sobreviver a um filho.Perder dois grandes Amores também já é crueldade de mais para três pessoas apenas.
    Muita força muita coragem e continua a escrever a Leninha vai gostar.

    1 bjo grande Ana V.

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  9. A melhor explicação de Deus que li até hoje foi esta:

    http://www.etudogentemorta.com/2010/02/nem-vais-acreditar/#comments

    Força!

    MJC

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